Pelas lentes de Ratão Diniz
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“O que me instigou a olhar para a fotografia é justamente esse suporte dela como memória, sabe? E uma memória coletiva. Ela não pertence só a mim que faço, ela pertence às pessoas que fotografam, a uma comunidade, a um lugar, a uma história, então eu penso muito nela nesse processo. Ela não é o fim. Permite estar em contato com histórias que eu vivi na minha infância, na minha adolescência. Ela me permite esse reencontro. Ela é uma ferramenta, um instrumento para que eu possa utilizar e somar. Permitir encontros e reencontros.“ – Palavras de Ratão Diniz em entrevista ao portal da ESPM-RIO.
Formado pela Escola de Fotografia Popular/Imagens do Povo, fundada na favela da Maré pelo Observatório de Favelas, Ratão Diniz é um fotógrafo carioca que consegue capturar e revelar, através de suas fotos, a beleza e a força de espaços afetivos. Morador do Complexo da Maré, lançou em 2015 o livro “Em Foto”, que apresenta mais de 200 fotografias feitas ao longo de seus 10 primeiros anos de carreira, reunindo, com um olhar sutil, personagens, relatos, locais e histórias de realidades sofridas, mas que, diariamente, resistem e se reinventam.
Antes de se tornar fotodocumentarista, Ratão teve uma trajetória marcada por experimentações. Ainda no ensino médio, era monitor de informática, e também encontrou espaço para explorar seu lado artístico como integrante de uma banda de punk rock. Durante a adolescência, chegou a ter uma loja de videogames, unindo hobby e trabalho. A escolha pela fotografia, finalmente, veio mais tarde, quando conheceu o trabalho do fundador da Escola de Fotografia Popular, João Roberto Ripper, cujo olhar humanizado para temas sociais o inspirou para se inserir no mundo das fotos.
Classifica seu trabalho como uma fotografia documental, popular e cultural, que transita entre o grafite, as favelas, as festas, até o povo do interior do Brasil, mas também como autoral. “Hoje classifico minha fotografia assim, porque eu permito de alguma forma, vamos dizer assim, a interferência. Nos retratos, de fazer escolhas a partir das minhas ideias. Era algo que tinha mais resistência, diziam ‘não é documental, não pode interferir’, por vir de uma escola tradicional. Porém, hoje eu me permito mais, entendo mais como uma fotografia autoral”.
Atuando profissionalmente como fotodocumentarista desde 2004, Ratão ingressou, em 2007, no projeto “Revelando os Brasis”, uma parceria da Secretaria do Audiovisual da Cultura com a Petrobras, que tem como objetivo a formação e a inclusão para moradores de cidades de até 20 mil habitantes. Os locais inscrevem histórias de sua região em um concurso. Após um processo de seleção, são escolhidas as melhores para a produção de um filme a ser apresentado na cidade de origem.
Há mais de dez anos Ratão fotografa os Bate-Bolas, grupos que andam fantasiados pelas ruas do subúrbio do Rio de Janeiro durante o carnaval. À convite de amigos, em 2010, enquanto ainda trabalhava no Sesc de Madureira, acompanhou a saída da Turma da Praça, importante turma de Marechal Hermes. A motivação para realizar esse trabalho vem da vontade de compartilhar a cultura carnavalesca que existe fora da Sapucaí, assim como falar das pessoas por trás das máscaras que torna isso possível.
Junto de sua companheira, Ratão mudou-se por um período para Pitimbu (PB). Vivendo no interior, a família cresceu com o nascimento de suas duas filhas, mas o fotógrafo manteve a prática de registrar o cotidiano local. As fotos servem como um processo de acervo e memória da cidade, que são preservados pelo olhar singular do fotodocumentarista. Esses anos que passou lá também o lembraram de quando sua mãe nordestina contava e detalhava, quando pequeno, os cenários e as estéticas do local onde vivia.
Ratão Diniz, atualmente, um dos mais importantes fotodocumentaristas brasileiros, recorda o episódio de quando fotografava a Turma Estrela, na favela do Muquiço: “(…) A galera falou, poh, ‘fotografa aqui, me fotografa aqui, me fotografa aqui’. E eu comecei a fotografar, fazer retratos das pessoas abraçadas, que são filhas, famílias da galera bate bola, vizinhos, conhecidos, entendeu? Era a favela ali me esperando para ser fotografada, fazer os retratos deles.”
Fotos: Ratão Diniz
Registro em Londres de grafiteiro em cima de duas latas de tinta.
Ratão possui grande acervo relacionado a arte do grafite.
Menino pendurado em poste com grafite de favela ao fundo.
Pescadores de Pitimbu (PB) sob olhar de Ratão.
Registros do Bloco da Lama em Paraty, no estado do Rio de Janeiro.
Jovens curtindo a praia em Pitimbu (PB).
Recorte da Favela da Nova Holanda.
Sr. Joaquim com seu acordeon.
Francisco Tárcio Araújo, contador da história do “Aboio” em Lajes, Rio Grande do Norte (RN).
Exibição de filme em Barra de Santa Rosa (PB).
O Reisado de Caretas de Potengi no Ceará (CE).
Reportagem: Alexandre Hid, Caio Tostes, Maria Vitoria Hucs e Yan Fernandes;
Supervisão: Luca Alexandre e Pedro Henrique Mello