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Mangás no Brasil: colecionadores sofrem com dificuldades do mercado

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Mangás no Brasil: colecionadores sofrem com problemas do mercado

No Brasil, 2022 foi o ano com mais mangás publicados. De acordo com levantamento do blog Biblioteca Brasileira de Mangás (BBM), oito editoras brasileiras de quadrinhos publicaram quase 600 volumes no ano passado, 100 a mais do que em 2021. Porém, essa alta oferta e produção não facilita o acesso às obras por parte dos consumidores, que sofrem com o alto preço das edições e a falta de muitas delas em estoque, além da ausência de plataformas de leitura digitais.

Os mangás são quadrinhos japoneses que se diferem dos ocidentais pelo sentido de leitura da direita para a esquerda e por não serem coloridos. Originário do período feudal (Séc XVII), no qual os artistas ilustravam as histórias em rolos de papel, o primeiro mangá, denominado Hokusai Mangá, foi publicado no século IX por Katsushika Hokusai, autor da pintura “A Grande Onda”. As obras se popularizaram no Brasil no início dos anos 2000, com os volumes de Dragon Ball da editora Conrad.

A maioria das animações japonesas (animes) são originárias dos mangás e seguem à risca os acontecimentos e diálogos dos quadrinhos. Obras como Dragon Ball, Naruto, One Piece, Pokemon, Cavaleiros do Zodíaco e Samurai X tiveram seus respectivos volumes lançados anos antes dos animes. 

Apesar de oito editoras brasileiras terem publicado mangás em 2022, apenas quatro são especializadas no ramo: Panini, JBC, NewPop e Pipoca e Nanquim. Com os direitos de publicação das produções mais vendidas no mundo, como One Piece, Dragon Ball, Chainsaw Man, Demon Slayer, Jujutsu Kaisen e Spy x Family, a Panini sempre dominou o mercado brasileiro, e em 2022 não foi diferente. O levantamento da BBM destaca que, dos quase 600 volumes publicados no ano, 70% são da editora de origem italiana, seguida da JBC, com 16%. 

Segundo a BBM, a média de preço das edições lançadas em 2022 é de quase R$40. Em 2020 o valor estava em R$28. Leonardo Nicolin, especialista no mercado de mangás e administrador da página @analyseit no Instagram, afirma que a principal causa desse aumento são os preços para importação. “No Japão os preços dos mangás são acessíveis, mas importar para o Brasil é complicado. O custo de expedição é alto e o real desvalorizado não ajuda. Se a compra é apenas para leitura, é mais vantajoso comprar em uma loja digital japonesa.”

Fernando Amaral coleciona quadrinhos há três anos e já conta com mais de 700 edições nas suas prateleiras, sendo a maioria de mangás. O estudante afirma que o preço dos quadrinhos japoneses fez com que ele mudasse sua forma de colecionar. “Hoje só coleciono séries curtas e oneshots. Até tem algumas longas que me interessam, mas é um comprometimento que não assumo mais, por conta do alto custo e pelo sumiço de alguns volumes.”

Mangás no Brasil: Colecionadores sofrem com dificuldades do mercado

Alguns mangás da prateleira de Fernando Amaral

O desaparecimento de algumas edições é recorrente no mercado, e afeta de séries de mangás não tão conhecidas à One Piece, a mais vendida do mundo. O colecionador Ygor Barros afirma ter problemas com os mangás de Parasyte, impressos pela JBC. “No momento, falta o volume 10, que procuro há mais de três anos. Sofri muito para encontrar o 9 e o 8 também.”

Para Leonardo Nicolin, uma boa análise de mercado das editoras evitaria esse fenômeno. “Isso geralmente acontece quando uma editora subestima a capacidade comercial da obra em questão, e, por isso, imprime poucos volumes. Uma equipe de análise de mercado competente diminuiria a possibilidade de faltar mangás nas prateleiras e nas lojas online.” 

Desde o final de 2020, a JBC e a Panini lançaram novamente alguns dos seus mangás mais vendidos. A primeira reimprimiu as suas coleções de Hunter x Hunter e Yuyu Hakusho, que juntas somam mais de 70 volumes. Enquanto isso, a Panini têm promovido a reimpressão de inúmeras obras que estavam em falta, como One Piece, Jojo’s Bizarre Adventures, Monster, Bleach, Akira e Slam Dunk. Porém, muitas séries ainda não foram reimpressas, e o mercado paralelo surgiu como uma solução para os colecionadores. 

A revenda de mangás acontece tanto em plataformas como Shopee e Mercado Livre, quanto em lojas online, como é o caso da Capitão Onigiri, de Henrique Lanute, que completará 10 anos em 2024. No início, o empreendedor focava na venda de lançamentos, mas, foi quando decidiu comercializar apenas mangás usados que o seu sebo cresceu. 

Para Lanute, o acesso às edições raras fez com que a Capitão Onigiri se tornasse referência no mercado paralelo. “Tenho acesso a coisas inimagináveis. Já recebi uma coleção da primeira impressão japonesa de Dragon Ball, lançada nos anos 80. Ela era de um colecionador de mais de 60 anos que faleceu, a esposa dele me enviou e eu vendi por R$1300. Normalmente valeria por volta de R$3000, mas a loja torna as raridades acessíveis.

Mangás no Brasil: Colecionadores sofrem com dificuldades do mercado

Primeiro volume da edição japonesa de Dragon Ball.

Fernando Amaral diz que, se o mercado paralelo não existisse, sua coleção teria metade do tamanho. “Os mangás que mais me interessam são antigos, então, quando comecei a colecionar, aproveitei muitas oportunidades nos sebos online e nas plataformas de revenda.”

Em busca de facilitar o acesso dos colecionadores às obras, Pedro Guina criou a Quero Mangá, um canal de divulgação de promoções e raridades, que já tem cerca de 5 mil inscritos. A Amazon e outras plataformas divulgam mangás em oferta diariamente, e Pedro os seleciona e posta no seu canal. Assim, ele encontrou soluções para o que considera o maior problema do mercado: a acessibilidade. 

“Além do preço, a questão da acessibilidade também inclui a falta de volumes em estoque. Isso desanima o colecionador, que muitas vezes não encontra a continuação do mangá desejado. Recebemos várias mensagens de pessoas que completam suas coleções ou conseguem obras raras por meio das nossas indicações, e isso é gratificante.”

Algumas empresas internacionais têm promovido um canal de leitura online. Um exemplo disso é a Viz Media, que oferece uma plataforma por assinatura com mais de 15 mil capítulos de mangás por três dólares mensais. Para o especialista Leonardo Nicolin, essa migração para o online é o principal desafio atual das editoras.

“A Shueisha é um exemplo de uma empresa que conseguiu estabilizar bem sua plataforma de assinatura, e, assim, confrontar a pirataria e atrair essa nova geração que lê mangás pelo celular ou PC. Fora do Japão, as questões de direitos autorais complicam ainda mais essa migração.”

Nicolin conclui que, independente das movimentações das editoras, o mercado de mangás ainda tem muitas décadas de vida. “O mercado tem passado por uma pequena ressaca após alcançar números ótimos entre 2019 e 2021 com Demon Slayer, Jujutsu Kaisen e Spy x Family. Surgirão novas obras tão populares quanto essas.”

Reportagem: Gabriel Rechenioti

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