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Crítica: Green Street Hooligans

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“Green Street Hooligans” é considerada uma das principais obras que trata de futebol nos cinemas. Lançado em 2005, o filme surge em meio a um período em que outras produções de peso também buscaram tratar sobre o principal esporte do planeta nas grandes telas. Enquanto “Gol” se propunha a acompanhar a trajetória dos atletas de futebol, “Hooligans” se ateve ao universo das torcidas, acompanhando a rivalidade das organizadas na Inglaterra.

O contexto em que o filme é produzido já se torna motivo de destaque. Os movimentos de torcida no futebol inglês – conhecidos como hooligans – teve início nos anos 70, e se intensificou, sobretudo, a partir de 1980. Com diversos clubes espalhados pelas principais cidades (somente em Londres, existem 17 equipes de futebol), a segregação do território a partir da formação destes nichos de torcedores radicalizados tornou algo estabelecido e consolidado na cultura do futebol local.

Os embates sangrentos tornaram-se parte do cotidiano, e isto é perfeitamente ilustrado na produção da diretora Lexi Alexander. A cineasta também é conhecida por outros filmes de ação, a exemplo, o longa  “O Justiceiro” (2008). As cenas de combate são apresentadas em alta velocidade, com cortes rápidos e dinâmicos. Em “Hooligans”, a proposta é mostrar o frenesi desses conflitos , com cenas rápidas, e cortes abruptos, quase frenéticos . Em alguma medida, o espectador sente-se presente naquela cena, e, ironicamente, perdido no espaço tal qual o protagonista, Matt Buckner.

O personagem interpretado por Elijah Wood – o eterno Frodo, de O Senhor dos Anéis, possibilita ao público a possibilidade de conhecer a fundo as dinâmicas dentro destes coletivos, assim como a hierarquia social que é estabelecida. Honra, status, reputação e lealdade, são algumas das principais temáticas que mobilizam esses personagens.

O interessante da obra está na sensibilidade por mostrar as diferentes camadas com que este coletivo de torcedores opera. De acordo com o filósofo estadunidense, Robert Merton (1970), as instituições sociais possuem suas funções manifestas e funções latentes – estas sendo a função que a organização se propõe no discurso, e as outras que ela realiza na prática, de forma indireta. Neste caso, a função manifesta da GSE – a Green Street Elite, representada na obra, une torcedores apaixonados pelo clube de futebol, West Ham United, a torcerem pela agremiação, e defender sua honra diante dos apoiadores de clubes rivais. Enquanto isso, sua função latente; e, conforme é representado no filme, a sua principal característica, termina por ser a junção de jovens que se encontram sem rumo, em busca de novas perspectivas, e a formação de um coletivo. As identidades regionais e até mesmo bairristas (GSE trata dos torcedores da zona leste de Londres), ajudam aos personagens a fortalecerem os laços com aqueles que são seus iguais, e, ao mesmo tempo, criarem uma profunda intolerância com quem não partilha dos mesmos valores. 

O filme é  um retrato social  que explora temas relevantes como violência, identidade, pertencimento e o papel do esporte na sociedade. O longa nos convida a refletir sobre as raízes da violência hooligan, as consequências de suas ações, além da busca por redenção em um mundo muitas vezes hostil. A produção não deixa de retratar a realidade sombria e brutal da cultura hooligan, e não glorifica a  violência, mas a expõe como um problema social complexo, e profundamente enraizado na sociedade inglesa. O futebol no filme é mais do que apenas um esporte, e sim uma forma de escapar da dura realidade da vida cotidiana.

Por outro lado, a obra apresenta reflexões a respeito do papel dos jornalistas. A produção mostra a atuação da grande imprensa na cobertura do futebol inglês, e a estigmatização dos hooligans. Isto ilustra a vilanização da figura do jornalista, visto como um manipulador da realidade, e um ator que desmerece a classe trabalhadora. Em alguma medida, esta temática se encontra presente nos tempos atuais, em meio aos movimentos de extrema direita, e a ode à desinformação. Novamente, o filme mostra como o esporte é um elemento intrínseco à cultura das sociedades urbanas ocidentais.

Por fim, é pertinente destacar a ironia ao analisar o filme no contexto contemporâneo. Afinal, o movimento do hooliganismo tornou-se enfraquecido nas últimas décadas. Este processo se originou a partir de um intenso trabalho de policiamento e inteligência das forças de segurança no Reino Unido. Apesar dos ganhos em relação a segurança, este movimento culminou por gourmetizar o público nos estádios de futebol. As arquibancadas com cadeiras, a criação das grandes arenas, a prioridade de venda de ingressos para sócio-torcedor – tais medidas marcam um movimento por extinguir os setores populares nos estádios, e a elitização de seu público. Com a Era Premier League, consolida  o fim (ou ao menos enfraquecimento) do hooliganismo, e surge a lógica do torcedor-consumidor, hoje tão dominante nas arquibancadas.

Reportagem: Davi Medina e Vinicius Nunes

Supervisão: Davi Rosenail e Joana Braga

 

 

 

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