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Gastronomia: da TV ao prato

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Os reality shows trouxeram uma nova visão para o brasileiro sobre gastronomia. Muitas pessoas que antes não se importavam com o tema passaram a se inspirar em casa e buscar restaurantes dos famosos chefs que viam na televisão. Neste contexto, o Masterchef, um dos maiores programas de culinária do Brasil, estreou sua nona temporada no dia 17 de maio, tendo seu primeiro episódio mais assistido em 2 anos, segundo os dados consolidados de audiência da Grande São Paulo.

Os primeiros programas culinários surgiram na segunda metade do século XX, em um formato diferente dos que dominam a televisão atualmente. Naquele período, o entretenimento era voltado somente para um apresentador que ensinava o passo a passo de alguma receita para os telespectadores. Com a ascensão dos reality shows, a gastronomia se transformou em mercadoria e seus personagens em celebridades. De acordo com o artigo “Gastronomia Midiática: reality shows e a estetização da comida na TV” de Renata Leite e Eleonora Lavinas, observa-se uma estrutura narrativa que pretende entreter e transmitir determinados valores morais. Originando uma direção quase contrária aos antigos programas de culinária que priorizavam receitas.

Além de mudar a perspectiva dos telespectadores, os realitys trouxeram um novo modo dos profissionais lidarem dentro do ambiente de trabalho. Lydia Gonzalez, chef de cozinha e ex-participante do Mestre do Sabor, reflete sobre o público não aceitar a forma agressiva de lidar com os cozinheiros e assim houve uma mudança: “Na postura dos chefs, no convívio e na forma de comunicação. Isso na verdade para a gente está realmente associado à exposição da gastronomia na televisão e a avaliação do público com relação aos comportamentos das pessoas que estão envolvidas numa cozinha”.

Além disso, outras mudanças positivas também podem ser vistas. Marília Cecília Roxo, chef de cozinha e ex-apresentadora do A Moda da Casa, diz que os programas refletiram em jovens que hoje pesquisam, estudam, testam e aplicam técnicas. “Gosto de vê-los trabalhando em grupo e procurando soluções para ‘dilemas’ quando o programa respeita os ingredientes, a cadeia produtiva e os profissionais”, diz Marília. Apesar disso, ela reflete sobre quem não têm conhecimento da profissão pode acabar se iludindo com a visão glamourizada e rasa passada por alguns programas.

A superficialidade dos realities não leva em conta quesitos básicos para se formar um bom cozinheiro,  “Na cozinha real não adianta somente o cozinheiro dominar técnicas ou ser apaixonado por cozinhar. No mundo profissional é necessário abraçar a gestão e o respeito pelo cliente, pelos colegas e ou funcionários, pelos fornecedores e pelo bolso.”

A narrativa construída nesses realitys trouxeram uma visão da gastronomia chamada “gourmet”. Este termo refere-se a algo mais elaborado, com ingredientes especiais que agregam valor ao produto. O enaltecimento dessa estética exalta uma imagem e um estilo não só da própria comida,  como  também  de  seus  personagens. Lydia ressalta a mudança de comportamento de consumo de alimento paralelo ao consumo de reality shows culinários: “Apesar das pessoas não saberem cozinhar, elas estão muito interessadas em saber como a comida é feita e eu acho que isso também está muito atribuído à exposição da cozinha na televisão e a forma como as pessoas consomem isso”. 

Tahís Lotif, chef do Armazém São Joaquim, também fala sobre a forma como estes programas influenciam na opinião das pessoas em relação à gastronomia. “Os reality shows abriram a mente das pessoas e aguçaram a curiosidade para quererem conhecer novos restaurantes e não só ficarem presas aquele tipo de comida e gastronomia que elas conhecem”, relata. Além disso, ela comenta sobre a questão de muitos deles adotarem valores promocionais justamente para aproximar os clientes dessa culinária mais elaborada.

Apesar desses restaurantes citados por Tahís, eles não são maioria. Atualmente a gastronomia é algo considerado elitizado, principalmente após a ascensão dos reality shows. No restaurante Oro, do chef Felipe Bronze, por exemplo, os menus de degustação variam entre R$545,00 e R$995,00. Além deste, um menu considerado executivo no Sal Gastronomia, restaurante do chef e apresentador Henrique Fogaça, custa entre R$77,00 e R$87,00.

Com essa elitização, as periferias foram deixadas de lado, então resolveram se movimentar para serem incluídas nesse meio. Projetos como “Circuito Gastronômico de Favela” e “Gastronomia Periférica” são exemplos disso. O primeiro consiste em um evento onde os cozinheiros das favelas de Belo Horizonte podem mostrar seu potencial e divulgar o trabalho e o segundo é uma capacitação para moradores de periferias, conscientizando sobre o aproveitamento total de alimentos, abrindo oportunidades de empreendimento no ramo.

A gastronomia é um ambiente diverso e muitos desejavam entrar, mas nem todos tinham sucesso. Os reality shows chegaram para mudar esse cenário, pois deu visibilidade para outras áreas e mostrou como o ambiente de trabalho pode ser diferente. Além disso, houve um incentivo, que levou a culinária mais elaborada para pessoas leigas, que começaram a se interessar pelo tema. “As pessoas ficaram mais criativas para cozinhar, elas quiserem ter acesso a mais receitas, quiseram aprender novas coisas”, fala Tahís.

Reportagem: Amanda Domicioli, Brenda Barros, Bruna Bittar, Gabriel Mota e Juliana Ribeiro

Supervisão: Clara Glitz e Fabiano Cruz

Crédito da foto capa: imagem/reprodução Masterchef

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