Menos de 17% dos produtos nas lojas dos clubes cariocas são destinados ao público feminino
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As lojas oficiais dos 4 maiores clubes cariocas apresentam em seus catálogos menos de 17% dos produtos de vestuário destinados ao público feminino. O Botafogo é o lanterna na lista, com apenas 13,42%, seguido pelo Vasco, com 16,37%, Fluminense, com 16,83% e Flamengo, com 17,82%.
O número de produtos masculinos nas lojas dos clubes cariocas é, em média, 3,62 vezes maior do que a quantidade de peças femininas, enquanto o de infantis é 1,53 vezes maior do que o de produtos para mulheres adultas. Esses números não representam a proporção de gênero entre os consumidores do esporte. Nos últimos anos, o público feminino no futebol tem crescido constantemente, principalmente em decorrência dos grandes eventos do Futebol Feminino, como a Copa do Mundo de 2019, na França, primeira edição a ser transmitida pela Globo.
Curiosamente, no ano passado (2020), um movimento originado no Twitter por duas torcedoras do Cruzeiro levantou a hashtag “MantoDasMina” e trouxe esse debate para as redes sociais. Na ação, as torcedoras pediam que os produtos femininos fossem fáceis de encontrar como os masculinos, que tivessem linhas completas e disponibilidade de todos os tamanhos. A ideia ganhou grandes proporções e diversas torcedoras ao redor do Brasil aderiram a essa causa, principalmente após o movimento ganhar visibilidade em grandes veículos de notícias do esporte.
Torcedora do Vasco e representante da torcida vascaína no Manto das Mina, Nicoli Yasmin, de 18 anos, acredita que o problema não se limita apenas às lojas oficiais dos clubes, mas se expande também para as lojas de departamentos e de materiais esportivos. “O motivo é que, talvez, alguns setores ainda não tenham entendido o papel e a proporção que as mulheres ocupam no consumo do futebol hoje em dia. É uma luta de muito tempo, mas que vem ganhando relevância, e ainda falta uma preocupação do mercado em voltar o olhar para a torcedora também como consumidora”, conclui Nicoli. A Shop Vasco, loja oficial do clube, por exemplo, tem apenas 28 produtos femininos entre os 171 produtos de vestuário disponíveis.
Dados do Estudo de Mercado de Consumo do Futebol Brasileiro, feito pelo Consórcio Nacional de Dirigentes e Lojistas em parceria com o SPC Brasil, apontados no gráfico abaixo, mostram que, em 2016, ano em que foi feito o estudo, 43,9% dos homens disseram comprar camisas de seu time. Já a porcentagem de mulheres que também disseram comprar camisas de time foi de 33%, uma diferença relativamente pequena, o que descarta a possibilidade de uma justificativa mercadológica para essa assimetria de tratamento. Em 2021, mesmo após o aumento do interesse feminino pelo futebol, a proporção das camisas de time masculinas e femininas nas lojas dos clubes cariocas ainda está muito longe de ser próxima à proporção de gênero entre os consumidores.
Na loja online do Botafogo, por exemplo, no momento da realização desta matéria, havia apenas 17 camisas femininas, dentre elas só 2 da Linha Oficial Kappa, utilizadas pelos jogadores em campo. A loja não tinha disponibilidade da Camisa 1 do time do Botafogo em um modelo feminino. Já em modelos masculinos, estavam à venda 83 opções de camisas, dentre elas 37 da Linha Oficial Kappa. A mesma Camisa 1 que não tinha um modelo feminino à venda tinha 11 personalizações diferentes disponíveis para o público masculino. Dentre os 4 clubes analisados, o Botafogo é o time com a menor proporção de produtos femininos, apenas 13,42% do seu catálogo de vestuário, o que representa 31 dos 231 produtos.
No caso do tricolor carioca, o problema é outro. O e-commerce do Fluminense oferece todas as camisas da Linha Umbro, usadas pelos jogadores, com e sem patrocinador para o público masculino. Já para o público feminino, os 3 modelos à venda da linha não continham a possibilidade de colocar os adesivos dos patrocinadores. Além disso, a Camisa 1 feminina não tinha todos os tamanhos disponíveis e nenhuma das peças de roupa de goleiro tinham um modelo feminino na loja. O Fluminense é o segundo lugar com a melhor proporção de produtos por gênero, o que não significa muita coisa: apenas 16,43% de seus produtos de vestuário são destinados ao público feminino.
Por outro lado, a Loja Oficial do Flamengo disponibiliza, dentre os sites dos clubes cariocas, o maior número de opções para o público feminino. No entanto, ainda está muito longe de ser uma proporção igualitária. Dos 279 produtos de vestuário, 155 eram masculinos e apenas 50 eram femininos. Tentamos entrar em contato com os clubes para entender o porquê dessa diferença tão brutal, mas não obtivemos respostas.
Nicoli acredita que para transformar esse cenário é necessária uma mudança de olhar capaz de entender e dimensionar o tamanho do público feminino no futebol. Na opinião dela, isso poderia ser feito através de pesquisas que mostrassem a proporção do consumo feminino no futebol. Para Nicoli, basta olhar as movimentações das torcidas nas redes sociais e enxergar essas mulheres que estão organizando projetos e movimentos, liderando e inovando, para que se inicie esse processo de mudança.
Reportagem: Arthur Vilela e Francisco da Silveira