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Dengue: como as mudanças climáticas podem modificar o comportamento da doença

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A arquiteta Caroline Range ficou afastada por quase um mês, somando todas as três vezes que teve dengue. Seus sintomas eram manchas vermelhas, dor no corpo e de cabeça e vômito. “O tratamento foi só para os sintomas, tomava remédio para as manifestações que apareciam. Fiquei de repouso absoluto, não podia ficar andando, porque como eu fiquei bem mal, tive medo das minhas plaquetas caírem e eu ficar internada”, relembra. 

O Brasil chegou à marca de 4 milhões de casos de dengue em 2024 segundo os dados do Ministério da Saúde. No ano passado, o número foi de 1,6 milhões de contaminações. De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, o estado alcançou a marca de 220 mil casos prováveis de dengue e 129 óbitos confirmados pela doença neste ano. Com o término do mês de abril, também chega ao fim o período epidêmico em que, historicamente, as curvas de transmissão costumam atingir seus índices mais altos. Dessa forma, o que esperar para os próximos meses?

Uma das principais causas citadas pelo Ministério da Saúde para o aumento exponencial dos casos é o impacto das mudanças climáticas. Essas transformações nos padrões de temperatura e no clima são processos de longo prazo que podem ter causas naturais, ou serem provocados e agravados por ações humanas como a queima de combustíveis fósseis, o desmatamento e as emissões de gases do efeito estufa. 

Secas intensas, queimadas e incêndios naturais, o derretimento das geleiras polares, o aumento do nível do mar e tempestades catastróficas são algumas das consequências que as alterações climáticas podem causar no planeta. As modificações no clima também podem afetar a prática de diversas atividades, a segurança e a saúde da sociedade. 

Sobre a influência das mudanças climáticas no período de maior transmissão da dengue, a Diretora do Departamento de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Alda Maria da Cruz, é enfática: “A dengue, assim como outras arboviroses, é  transmitida por um vetor. As alterações climáticas modificam o comportamento biológico desses vetores. Assim, é possível que o vírus se desenvolva muito mais rapidamente e o vetor se torne mais transmissível.” 

Outra consequência das alterações climáticas se relaciona ao comportamento do homem, cita Alda. A diretora exemplifica os momentos de seca, quando as pessoas tendem a acumular mais água para o consumo, e os momentos de chuva, quando essa água é acumulada em pequenos reservatórios. Segundo afirma, estas são duas situações em que ocorrem a formação de criadouros, espaços de acúmulo de água parada que servem para o desenvolvimento do Aedes aegypti, o mosquito vetor da dengue.

Alda Maria, que também é pesquisadora em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), analisa como o processo de urbanização e a falta adequada de coleta de lixo podem agravar a criação dos criadouros e o cenário da dengue no Brasil. “Juntos, esses dois processos são responsáveis pelo desenvolvimento de locais onde existem vários pequenos reservatórios removíveis, como copos, tampinhas e garrafas que acumulam água em terrenos baldios.” Ela também lembra os grandes reservatórios, como piscinas abandonadas, calhas, entre outros. 

Dados do Infodengue, projeto da FIOCRUZ que realiza várias modelagens e análises epidemiológicas, já indicavam no final de 2023 uma predição e faziam alerta para um aumento muito grande no número de casos de dengue para 2024. Porém, o que pode estar relacionado às condições climáticas e que surpreendeu os analistas, foi a antecipação do intervalo de tempo considerado o mais crítico da doença, geralmente entre março e abril. Assim, desde janeiro as curvas de transmissões e contaminações já estavam aumentando de maneira acima do esperado. Mesmo com o alerta da Organização Mundial de Saúde (OMS) para os países das Américas e com as medidas de prevenção, altos índices de contaminação pela virose foram notificados. 

No dia 6 de abril, a Secretaria do Município do Rio de Janeiro anunciou o fim do recebimento de novas remessas da vacina Qdenga. Mesmo assim, crianças e adolescentes, entre 10 e 14 anos, ainda podem receber as doses remanescentes do imunizante em unidades de saúde da Atenção Primária, clínicas da família e centros municipais de saúde. Junto da paralisação dos envios de novos lotes da vacina que, até agora, não tem previsão para retornar, no dia 5 de abril, o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, declarou o fim da epidemia na capital carioca.

Segundo o último boletim Infodengue, publicado no dia 28 de abril, o Rio permanece com níveis de atenção alta, mas com sinais claros de redução das notificações, o que indica que o estado já passou pela fase de pico da doença. 

De acordo com as últimas projeções do Ministério da Saúde, é esperado que a partir de novembro aconteça um novo aumento de casos. O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Alberto Chebabo, mantém cautela ao comentar a evolução do número de ocorrências de dengue. “Temos que nos preparar para o pior cenário. O Brasil é um país continental, então é possível ter diferentes curvas de incidência entre os estados e as regiões distintas”, enfatiza. O presidente ainda ressalta que apesar das previsões nem sempre serem precisas, ele acredita que o número de casos, mesmo ainda muito altos, entrem em queda a partir de maio, quando o Brasil entra em seu período mais frio e seco do ano.

Reportagem: Alexandre Hid, Fátima Moraes e Pedro Henrique Mello

Supervisão: Davi Rosenail e Joana Braga

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