O crescimento das barras bravas no futebol carioca
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Barras bravas é um movimento das arquibancadas de origem sul-americana (com destaque para Argentina e Uruguai) que chegou ao Brasil através do Grêmio, por influência dos países vizinhos. Ele é conhecido pelo amor dos torcedores, pela presença nos jogos atrás do gol, pelo estilo diferenciado de cantar, pelo uso de faixas com palavras de apoio e marcado por grandes festas. Em 2006, chegou ao Rio de Janeiro através da barra botafoguense, a Loucos pelo Botafogo, quando conquistou espaço nas arquibancadas cariocas. A partir disso, a escolha das barras tem sido cada vez maior para torcedores fanáticos que visam ir ao estádio a fim de apoiar seus times e sem se envolver com a violência de torcidas.
Exaltar o clube, cantar independentemente de resultados, estar distante de brigas, estender faixas com as cores do time e levantar bandeirolas são marcas das barras cariocas. Hoje, os quatro grandes times do Rio já contam com as barras nas arquibancadas.
Fellipe Portela, de 25 anos, é diretor da barra botafoguense. Ele conta que, no início, a ideologia enfrentou resistências em relação à cultura de torcidas organizadas que já existia no Rio, e que o forte e diferenciado alento chocou os torcedores. “Eu costumo dizer que a Loucos veio pra causar”, brincou. Além disso, ele diz que a barra possui uma relação amigável com o GEPE (Grupamento Especial de Policiamento nos Estádios), sempre explicando que a ideologia da torcida é fazer festa e, em hipótese alguma, propagar a violência, o que difere as barras cariocas das argentinas. Portela relata que, no início, o grupo não tinha espaço nos estádios e, por isso, não podia sequer usar suas faixas. “Hoje, a Loucos é uma das principais torcidas do Botafogo e temos mais de 30 núcleos espalhados pelo Brasil, incluindo Amapá e Manaus. Nós somos muito felizes por essa realidade, por crescer cada vez mais e por exaltar o time espalhando essa ideologia”, completou.
Atualmente, a Loucos se sustenta com um programa de sócio da torcida, em que os membros contribuem com R$20 mensais, que possibilitam desconto em produtos, caravanas e eventos. O diretor acrescentou que as barras são uma esperança de crescimento da paz em meio a violência nos estádios e disse que considera tais atos tolice. “Para que eu vou sair do estádio e arrumar confusão? Eu quero exaltar meu time, não quero machucar e muito menos matar alguém”, desabafou. Esse fator é o que atrai muitos jovens como Roberta Lucena, estudante de 19 anos, que diz gostar da Loucos por ser a torcida mais apaixonada do Botafogo. “Não se envolve em brigas e faz de tudo pra empurrar o time de todas as maneiras possíveis. É uma torcida de paz que dá a vida pelo time”, contou.
Logo após a criação da barra botafoguense, ainda em 2006, foi criada a Guerreiros do Almirante (GDA), representando o Vasco. A barra vascaína é sustentada através de rifas, festas e venda de materiais e, segundo o líder Breno Batista, de 30 anos, quando há a necessidade de uma maior quantia de dinheiro, os torcedores se mobilizam e colaboram. Ele diz que a torcida tenta resgatar tudo aquilo que um dia foi essência para as torcidas organizadas. “A gente tem que apoiar o clube, tem que estar junto, tem que fazer de tudo por ele, e não construir um nome da torcida mais valente ou mais poderosa.”, disse. Ele contou que já participou de um movimento de torcidas organizadas, mas não o agradou. “Eu via covardia, arma de fogo e passei a me questionar. Aquilo não era torcida, era coisa de gangue”, lembrou.
O líder acrescentou que o crescimento das barras pode ser perigoso, já que, assim, pode-se perder o controle. “Mais importante do que crescer, é crescer com a ideologia e entender que o que importa é protagonizar festas em razão do amor pelo clube.” Ao ser questionado sobre as questões de violência no futebol, Breno disse que as torcidas violentas são produto de uma sociedade intolerante. “É inevitável que isso aconteça, a questão é educacional. A melhor maneira de lidar com isso é a conversa com a galera da torcida, mostrar que não vale a pena e estar sempre orientando”, contou. Ele ainda criticou as ações do GEPE, que pune as torcidas de forma generalizada, e não apenas aqueles que cometem atos violentos. “Se você pega um grupo brigando, prende esses caras, mas é muito mais fácil punir o coletivo inteiro. Assim, prejudica quem está ali batalhando para mudar o rumo dessa história”. Pessoas que vão ao estádio e ficam longe de torcidas também se identificam com a barra, pois acreditam ser ela a mais pacífica, como Eduardo Pacheco, estudante de 22 anos, que diz não se identificar com nenhuma torcida do Vasco. Se tivesse de escolher, ressaltou, escolheria a GDA. “Eu acredito que seja a torcida que menos se envolve em brigas”, justificou.
A Bravo 52 é a barra brava do Fluminense, que foi criada em 2009, vinda do Movimento Legião Tricolor de 2006. A ideia de criar a barra surgiu de Luiz Augusto, de 41 anos, e seus amigos, que já faziam parte da Legião e visavam uma torcida que cantasse os 90 minutos em apoio ao clube como as barras sul-americanas. Por meio da confecção de camisas da barra, canecas e chapéus, a Bravo faz venda de seus produtos e lucra através de caravanas para se sustentar e crescer. Apesar de serem mais novas que as argentinas, as barras cariocas, segundo Luiz, se diferenciam pelo índice de violência nos estádios. “Eu acredito que isso não vá mudar. As barras aqui no Rio não têm intuito de criar rixas. Somos sempre adversários, mas nunca inimigos”.
Ele acrescentou ainda que a relação da Bravo 52 com outras barras é de respeito mútuo, e que está sendo estudada a ideia de criar uma liga de torcidas barras no Rio, não só com as torcidas dos quatro grandes, mas com times menores, como Portuguesa e Bangu. “Essa liga vai visar o crescimento desse estilo para que ele ganhe corpo. Queremos ter maior representatividade.” O fundador conta que sente que o movimento mudou a forma que os tricolores se comportam no estádio. “A gente percebe as pessoas indo para apoiar, para cantar os 90 minutos junto com a Bravo”, disse.
Luiz também lamentou a restrição de material no estádio pela GEPE, o que impede que o crescimento do movimento seja maior. “Isso limita a festa que as pessoas tanto gostam. A torcida do Fluminense simpatiza com a gente, com o nosso estilo e nossos cantos. Falta diminuir essas proibições para que possamos crescer mais”, disse. Entretanto, ele entende que eles não são responsáveis pelas normas que devem ser seguidas. “Nossa relação com eles é pautada pela confiança. Estamos todos ali pela harmonia nos estádios”, ressaltou. Além disso, ele fez menção ao movimento “Bravas da 52”, o grupo de meninas que tenta mudar a ideia de que futebol é coisa de homem: “Elas torcem e levantam a bandeira contra o machismo. Elas se reúnem, cantam e levam a torcida junto com a gente”, acrescentou. A forma de torcer da Bravo atraiu a tricolor e estudante Isabelle Fajardo de 19 anos, que reside em Volta Redonda e diz se simpatizar com o movimento. Ela afirma que, se morasse no Rio de Janeiro, faria parte da barra. “É uma torcida pacífica”, disse.
A barra brava do Flamengo é a Nação 12 e surgiu em busca de um canto sincronizado nas arquibancadas flamenguistas. Foi fundada em 2009 a fim de não vaiar o time, mesmo no pior momento, e sim, apoiá-lo até o fim. Assim como as outras barras, o financiamento é feito através da venda de materiais e de contribuições dos torcedores. Segundo o integrante Patrick Neves, de 18 anos, o estilo de torcer das barras são diferentes. Ele revela que é amigo de integrantes da Loucos, da GDA e da Bravo 52: “Nunca seremos inimigos”, disse. Ele contou que, em todo jogo, a relação com o GEPE é bem simples. “É reunião e jogo, apenas isso”, afirma. O integrante conta que, desde 2013, quando passou a acompanhar a barra, o número de agregados é cada vez maior. “Acredito que o número de torcedores da Nação hoje está cinco vezes maior e o mais importante, a ideologia, ainda é a mesma”, contou.