Como transformar histórias em boas escutas? O futuro dos podcasts jornalísticos no mercado
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A produção do podcast jornalístico foi o tema da mesa “Apurar, Narrar, Ouvir: Como construir um podcast jornalístico”, mediada por Duda Reis, com a presença de Branca Vianna, fundadora e presidente da Rádio Novelo e Mari Faria, diretora do podcast Foro de Teresina.
A mesa abriu o segundo dia da Semana do Jornalismo da ESPM-Rio, que aconteceu de forma remota devido à megaoperação no Rio de Janeiro. A conversa trabalhou o poder das narrativas sonoras e a importância do cuidado com os dilemas éticos.

Branca Vianna à esquerda, acompanhada por Mari Faria e Duda Reis em mesa remota durante a Semana do Jornalismo ESPM
Com o imediatismo do jornalismo e a busca por informações precisas, o podcast jornalístico narrativo surge como um espaço de reflexão e escuta. “Nenhuma pauta vale se você for prejudicar a vida de um cidadão inocente” declarou Branca Vianna, destacando os limites que devem orientar o trabalho jornalístico.
Mari Faria também sinalizou esse cuidado ao relembrar casos como o de Eloá Cristine, menina de 15 anos mantida em cárcere privado pelo ex-namorado por mais de 100 horas. O caso foi exposto pela imprensa de forma imediata, facilitando o acesso de Lindemberg a informações sobre o plano de resgate, o que resultou no assassinato de Eloá, chamando atenção para as consequências de uma cobertura sem sensibilidade.
As palestrantes destacaram a importância de compreender os limites entre a denúncia e o respeito à intimidade. Branca ressaltou que o compromisso do jornalista deve ser, antes de tudo, com as pessoas retratadas, especialmente quando se apresentam personagens comuns. “São pessoas que não devem explicações a ninguém, e é nosso papel respeitar sua vontade”, apontou Branca. Mari Faria observou que, ao lidar com histórias reais, é inevitável enfrentar dilemas sobre o que deve ou não ser contado. “O podcast não é um discurso, ele precisa acabar em um momento”, afirmou Mari, lembrando que toda escolha narrativa carrega uma responsabilidade e a ética no jornalismo não se limita a evitar danos, mas envolve também escuta e empatia ao narrar experiências humanas.
A escuta sensível e atenta, destacada como essencial no podcast jornalístico, deve estar presente em todas as etapas da produção. Quando o trabalho é conduzido com esse cuidado, o ouvinte é inserido na narrativa e se situa no contexto histórico em que aquela pauta acontece. Branca destacou a importância desse olhar em “Praia dos Ossos”, podcast da Rádio Novelo que revisita a história de Ângela Diniz, assassinada em 1976 pelo então namorado Doca Street. O podcast idealizado e apresentado por Branca buscou ouvir pessoas comuns envolvidas no caso, além de falar sobre o cenário social e político da época, mostrando como a justiça tratava crimes de gênero e o impacto que isso resultava na vida das vítimas e dos agressores.
Ao narrar a trajetória de Doca Street, condenado pelo assassinato, o podcast “Praia dos Ossos” também levanta uma reflexão sobre o que significa fazer justiça. O que acontece com um homem que comete um crime como esses, e que tipo de transformação uma condenação é capaz de resultar.
As jornalistas também reforçaram a importância de escolher o formato ideal para cada tipo de narrativa. Nem toda história encontra no áudio o meio mais adequado para ser contada, algumas pautas funcionam melhor em outras linguagens. “No texto pode ser mais fácil, talvez ninguém saiba quem está por trás dele”, sublinhou Branca. Ela destacou ainda que compreender o alcance e os limites de cada mídia é parte do trabalho de apuração, já que o formato influencia diretamente na forma como o público recebe a informação. Cada meio exige diferentes estratégias de narrativa e cuidado ético, especialmente ao lidar com histórias sensíveis, em que a escolha do formato pode proteger ou expor os personagens retratados.
Os caminhos para quem deseja se inserir no mercado de podcasts jornalísticos também foram debatidos na mesa. As convidadas concordaram que o primeiro passo é construir um repertório sólido. “Para você produzir podcast precisa ter muito repertório, o que você lê e ouve pode agregar”, destacou Mari Faria refletindo a importância de um consumo de produtos diversos. Ler, ouvir e observar diferentes produtos jornalísticos constrói uma base criativa e contribui para o conteúdo se destacar e ser um diferencial no mercado.
Capa: Arthur Zanotelli
Reportagem: Júlia Luparelli e Maria Eduarda Torres
Supervisão: Vinicius Carvalho



