Racismo na boca do povo
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O Brasil foi o último país a abolir a escravidão e isso reflete até os dias de hoje. Após 132 anos da Lei Áurea, a data não é motivo de celebração para a população afrodescendente. A lei que pregava a liberdade não se preocupou em inserir o negro na estrutura de trabalho e, por isso, manteve a segregação. Os reflexos dessa ação são vistos até hoje, o mercado de trabalho ainda é um meio muito segregacionista, além da língua portuguesa ter incorporado várias expressões de cunho racista que se tornaram corriqueiras com o passar do tempo, e que são ditas atualmente sem as pessoas saberem o real significado destas palavras.
Essas palavras dizem muito sobre uma cultura. Entre “brincadeiras”, “cortejos” e “elogios” a discriminação racial se amplia e se camufla. Expressões como mulata, a cor do pecado ou denegrir, que são naturalizadas na cultura do país, tem cunho agressivo e preconceituoso. Conversamos com o palestrante Levi Kaique Ferreira , sobre o significado do dia 13 de maio para o movimento negro. Para o palestrante, o dia é uma data de lembrança e não de comemoração propriamente dita. “É uma data para a gente mostrar que a nossa luta, as nossas pressões internas, as lutas abolicionistas foram fortes para que o império abolisse a escravatura mesmo que tarde, mas aboliu por nossas pressões”.
Devido ao tardio fim da escravatura no Brasil, de acordo com ele, não fazemos uma leitura crítica do fato. Existe uma visão de que esse seria um ato de heroísmo, sendo que não foi algo dado a população negra. “Há um vício de criar o contexto do branco salvador em cima disso tudo, que acaba propiciando esse epistemicídio que a branquitude promove, reescreve a história a partir de uma perspectiva branca e a negritude sai como coadjuvante da própria história, precisamos reaver o protagonismo da nossa própria luta”. Esse contexto já virou roteiro em diversas adaptações hollywoodianas como “Green Book: o guia” , “Histórias Cruzadas”, “Um sonho possível”, entre outros.
Para mudar essa realidade, Levi diz que é necessário reafirmar o protagonismo do povo preto na luta anti racista, contra a escravidão. E citar nomes como Luís Gama, André Rebouças e Adelina. “A gente precisa de informação, destruir esse epistemicídio a partir da perspectiva de contar a história correta do ponto de vista negro, o protagonismo deles”. Com o objetivo de mudar esta realidade, diretores de cinema como Spike Lee e Jordan Peele usam seus filmes para trazer maior representatividade ao entretenimento, como “Infiltrado na Klan” e “Corra!”.
Para a historiadora Karoline Miranda, a língua portuguesa tem vários termos e gírias, que possuem cunho racista e acabam sendo normalizadas, com algumas palavras sendo adaptadas para entrar no dicionário da elite. “Uma língua feita para brancos carregaria consigo todos os preconceitos e discriminações características da branquitude, ou seja, racismo. O racismo estrutural faz com que a gente pense que o normal é ser racista, e não o contrário”.
Karoline ainda conta sua opinião sobre a política de embranquecimento da população no Brasil. Segundo a historiadora, a Lei Áurea não foi uma política de liberdade, mas sim de extermínio. “Logo após a Lei Áurea, as medidas higienistas vieram com força dizer que os negros eram responsáveis pela maioria dos vícios da sociedade, e isso perdura até hoje. É necessário que o povo preto se empodere e que os brancos se tornem anti racistas”. Logo, o dia de hoje é marcado pela resistência do povo negro, onde fazem questão de lembrar os verdadeiros conquistadores da abolição foram apagados da história pela visão branca. Por isso, o dia 20 de novembro ficou mais marcado pelas comemorações do orgulho negro por ser a data da consciência negra e de Zumbi dos Palmares, onde nenhum branco pode mudar a visão desta parte da história.
Reportagem: Ana Júlia Oliveira, Bruna Barros, Camila Hucs, Eloah Almeida, Felipe Rinaldi, João Medina e Pedro Cardoso
Supervisão: Mariana Colpas e Patrick Garrido