Funk Sem Escalas: A Internacionalização do Som das Ruas
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Em novembro do ano passado, o DJ carioca “Ramon Sucesso” lançou um vinil com duas faixas de sons típicos das festas do Rio de Janeiro. O disco foi divulgado por lojas na Europa e analisado por publicações internacionais. Em Abril deste ano, a rádio inglesa NTS disponibilizou uma coletânea de músicas de Funk Paulista. O compilado contou com a participação de dezenas de produtores e MCs que colaboraram com a iniciativa. Camisas e LPs foram postos à venda juntos com o projeto para os fãs. Esses dois lançamentos representam a internacionalização do funk nos últimos anos para além de artistas pop mais presentes na mídia.
A busca por um mercado internacional para o funk é algo perceptível no cenário da cultura pop global. Artistas brasileiros também se esforçam para internacionalizar o ritmo, a cantora Anitta assumiu sua intenção de exportar o funk ao redor do mundo. Seu último álbum, intitulado “Funk Generation”, busca apresentar o gênero musical em diferentes contextos, seja com elementos eletrônicos diferentes ou cantado em outras línguas. Além dela, Ludmilla assume um protagonismo nesse processo, tendo se apresentado em abril em um dos maiores festivais de música do mundo, o Coachella, em Los Angeles.
Segundo o Etnomusicologista, Jornalista e Curador da coletânea “funk.BR – São Paulo (NTS)”, Felipe Maia, o funk internacionaliza por três vias: grandes artistas que se associam a ideia de música latina, artistas estrangeiros que fazem uso do gênero e por DJs e produtores que acompanham aquilo que é feito pelas margens da cena musical. Felipe fez a compilação com o cuidado de mostrar a representatividade do gênero. “Se existe um abismo entre a rua e o que se espera no norte global, existem também caminhos, e cabe às pessoas que têm o privilégio de poder fazer essa conexão trilhar esses caminhos”.
O disco apresenta diversos formatos do gênero dentro de São Paulo em 22 faixas. Segundo Felipe, a escolha pelos sons paulistas veio por conta da quantidade de novidades ainda não catalogadas. “A gente queria dar vazão para um tipo de som dentro do funk que ainda não tinha sido envelopado. E a produção de São Paulo era muito grande.” O resultado é uma coletânea que mostra um tempo específico e o tipo de música que vem representando os bailes da maior metrópole do país.
Créditos: Mile LAB
No Rio de Janeiro, o DJ Ramon Sucesso, viralizou na internet com seu quadro “Sexta dos Crias”, no qual apresenta músicas com o um áudio em volume alto enquanto a câmera do celular vibra com a projeção dos graves. Após essa explosão, o músico de Belford Roxo alcançou fãs estrangeiros que ficaram maravilhados com seu estilo. “Eles acham diferente e por isso gostam bastante”. Isso contribuiu para que duas faixas suas, cada uma com 15 minutos, fossem prensadas em vinil pelo selo Lugar Alto, de São Paulo. As tracks são mixagens e colagens sonoras populares no cotidiano carioca apresentadas em um formato diferente do comum.
O artista afirma ter ficado emocionado com a repercussão, e que chegou a ser destacado por lojas de discos da França e Inglaterra. Com esse êxito, o DJ já tem datas de show marcadas na Espanha, Portugal, Reino Unido, França e Polônia. A turnê europeia é um marco e significa um momento de grande realização, segundo Ramon.
Créditos: Sometimes Always
Essa movimentação tem sido observada, também, pela crítica e pelo jornalismo especializado. O LP “Sexta dos Crias” recebeu nota 7.7 pela publicação americana Pitchfork, considerada alta na escala do site. Outros discos como “Pânico no Submundo”, de DJ K, e “Queridão”, do mineiro DJ Anderson do Paraíso, também foram bem falados. A jornalista americana Nadine Smith fez as resenhas desses dois últimos trabalhos e dedica grande parte de sua pesquisa atual ao funk brasileiro, “Descobrir o quão diverso e gigantesco é o universo desse gênero tem sido um grande prazer nesses últimos anos”, ela afirma. Apesar disso, Nadine explica que ainda é difícil convencer a parcela mais conservadora desse meio que o Funk deve ser respeitado, além da perspectiva de que algo só é importante quando começa a gerar lucros econômicos.
Esse fenômeno desperta questionamentos quanto à apropriação de uma música originalmente brasileira. Cria-se, também, uma ideia de legitimação através do sucesso internacional, muito debatida pelos próprios artistas que fazem parte dessa movimentação. Para Felipe Maia é preciso entender tudo que acontece para conseguir dar bons passos futuros: “O próximo grande desafio do funk não é chegar na Europa, é criar pontes e plataformas que estruturam essa música para além do exotismo e da categoria de música latina”.
Reportagem: Luca Alexandre
Supervisão: Carolina Dorfman e Eduardo Gama