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A desvalorização do jornalismo esportivo feito por mulheres

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“Vadia”, “boca fedendo” e “projeto de lixo” são alguns dos comentários deixados nas últimas publicações no Instagram de Renata Silveira, narradora da Globo que foi vítima, novamente, de ataques machistas relacionados ao seu trabalho. Um usuário do Twitter chegou a dizer que seria um castigo assistir a disputa entre Flamengo e Fluminense, pelas oitavas de final da Copa do Brasil, com a narração da profissional. A locutora compartilhou um print que expõe as ofensas acompanhado de um pedido para que seus fãs a ajudassem a denunciar os responsáveis. Essa não é a primeira vez que mulheres sofrem ataques desmedidos no meio do jornalismo esportivo.  

Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Jornalistas aponta que 83,6% das mulheres relataram já ter sofrido algum tipo de violência psicológica nas redações e que 73% das profissionais afirmaram ter escutado comentários ou piadas de natureza sexual sobre outras mulheres enquanto trabalhavam, o que evidencia a falta de segurança presente no próprio ambiente profissional.  Eliza Ranieri, jornalista da Live Mode, afirmou que se sente diminuída a todo momento na sua área. A profissional diz que, desde que entrou no meio futebolístico sente que sua opinião vale menos e que sempre precisa se provar mais do que os homens. Esse é um problema mais complicado de se resolver, pois é um preconceito velado; Eliza também aborda a questão ao dizer que, “eu vou chegar e vou falar não estou me sentindo ouvida, não estou sentindo que a minha opinião é considerada, e aí o cara vai falar ‘não, imagina’, porque aí ele vai achar um jeito de dizer que eu estou louca, que eu estou vendo coisa onde não tem, que eu estou problematizando demais. Isso acontece o tempo todo.” comenta.  

Isabelle Costa, repórter esportiva, contou que, recentemente, quando participava da cobertura de Vasco e Flamengo pelo campeonato carioca na Cazé TV, viveu o pior momento da sua carreira. As transmissões realizadas pelo canal, são conhecidas por serem inovadoras e mais leves, na qual os jornalistas têm seus clubes declarados. Ela diz que, durante o jogo, fez algumas brincadeiras, normais para o momento, mas também passou informações táticas e comentou sobre questões físicas dos jogadores do Flamengo, seu time de coração. Porém, alguns torcedores pegaram determinadas brincadeiras que ela fez com o Casimiro, dono da emissora, e com o Pedrosa, comentarista responsável pelo Vasco, e a atacaram em suas redes sociais, com comentários do tipo, “você é um lixo”, “Piranha” e “Incompetente”. “E não tinha uma justificativa, foi muito mais por uma questão de eu ser mulher, porque o Pedrosa tava na mesma posição que a minha, só que do lado do Vasco, e ninguém falou nada sobre ele”, argumentou Belle. 

O jornalismo esportivo é um ambiente estruturalmente dominado por homens, e isso fica claro ao observar programas de debate sobre esporte, como Linha de Passe e SportsCenter, por exemplo. Fabi Alvim, ex-atleta bicampeã olímpica de vôlei e comentarista da Globo, relatou que esse foi um dos motivos que a incentivaram entrar nesse ramo, “você acaba se acostumando de não ter mulheres ali, mas de alguma forma você se sente incomodada. E acho que é mais ou menos por aí, você passa a querer fazer parte daquilo, passa a querer mexer um pouco com a estrutura, ver outras mulheres do seu lado, querer consumir mulheres, né? Então num primeiro momento é um ambiente que replica aquilo que a nossa sociedade é, extremamente machista, dominada por homens e patriarcal”, afirma a ex-atleta.  

É definitivamente mais difícil para as mulheres se destacarem no meio esportivo do que os homens, e isso se deve muito mais porque as pessoas se acostumaram a ver uma figura masculina na posição, ou a levar em consideração a opinião masculina, como se a mulher não estivesse preparada e apta para estar naquele ambiente, como se não obtivesse domínio para falar sobre o assunto. “Estruturalmente as mulheres nunca falaram sobre Copa do Mundo de futebol, sobre o ataque do Corinthians, ou do Flamengo, ou do Fluminense, nunca tiveram as suas visões táticas do jogo e talvez seja um receio de perder espaço também”, reitera Fabi. A ex-atleta ainda complementou ao dizer, “O que eu espero é que a gente consiga mexer e abalar essas estruturas e que a gente não dê mais nenhum passo pra trás, apenas pra frente, que outras mulheres surjam, que outras mulheres estimulem mais outras mulheres a ocuparem esses espaços” completa.

Reportagem: Manuela Monzo

Supervisão: Maria Eduarda Martinez

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