Portal Literário- O Retrato de Dorian Grey
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Lançado em 1891 e precursor do século das grandes transformações, O Retrato De Dorian Gray, obra-prima do escritor e dramaturgo Oscar Wilde, pode ser definido como um livro notoriamente moderno. Vítima de múltiplas censuras e críticas da sociedade vitoriana, Wilde criou em seu único romance um personagem tão terrível, que foi utilizado como prova no tribunal em meio a um processo por indecência.
A vida de um pintor, um lorde e um belo rapaz mudaria para sempre com um retrato. O artista Basil Hallward e seu objeto de inspiração, o jovem Dorian Gray, estão no ateliê do pintor quando se encontram com Lorde Henry, um típico aristocrata. O que o protagonista não sabia é que diante de um simples encontro para discutir uma peça de arte, lhe seriam feitas perigosas revelações. O atrito entre os três ocorre quando Lorde Henry torna Dorian consciente de sua beleza efêmera e de sua própria mortalidade, que fará com que ele envelheça, fique inevitavelmente feio, enquanto o retrato permanecerá para sempre belo e intocável.
Ao se ver sozinho, Dorian decide abdicar de sua inocência e faz um pacto com o diabo. Pelo presente de jamais envelhecer, ele entrega sua alma ao inferno e faz uma troca inconsciente com o retrato. Jamais saberia o que é a dor de não ser mais desejado, porém, o que acompanhamos no decorrer do livro é a degradação de Dorian e, logo, do seu próprio retrato. Quanto mais cruel, frio e sádico ele se torna, mais invejada e perfeita é a sua tez, por outro lado, mais podre é a sua alma. O livro se desenrola como um novelo de lã que busca se aprofundar cada vez mais na imensa e absurda maldade humana, criando uma espécie de reinterpretação do conto de Narciso e explorando as facetas de uma juventude corrompida e autodestrutiva.
Além da premissa obscura e fantástica do livro, é inegável o caráter hedonista da obra, que foi capaz de horrorizar a sociedade da época. Múltiplas alusões à poligamia e a presença constante de uma tensão homoerotica entre os três personagens estão presentes durante todo o livro, fato este que foi utilizado como prova contra Wilde em seu julgamento, onde foi acusado e condenado por ser homossexual. O texto teve de ser modificado e mascarado diversas vezes antes de sua publicação na tentativa de atenuar as temáticas retratadas no livro, mesmo assim não foi suficiente para passar despercebido. Somente em 2011, foi publicado o texto integral e inalterado que Wilde havia idealizado desde o início.
Em sua versão gótica do lendário Fausto, Wilde cria uma narrativa de horror, intriga e filosofia, dotado de um imenso talento, humor e perfeccionismo para a escrita que jamais poderia ter sido celebrada em sua época. Assim, é possível dizer que não só seu personagem foi vítima do esteticismo, mas o próprio destino do escritor teria sido selado por este.
Apesar de ter morrido com desgosto, sozinho e pobre, o escritor defendeu sua obra até o fim de sua vida, alegando que era de se esperar que uma sociedade cega fosse incapaz de compreender sua obra de arte: “Não existe um livro moral ou imoral. Os livros são bem escritos, ou mal escritos. Isso é tudo.”
Reportagem: Davi Magalhães
Supervisão: Carolina Dorfman e Eduardo Gama