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Centenário da Resposta Histórica: A importância e o impacto no futebol atual

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O dia 7 de abril de 1924 marca um dos primeiros atos contra o preconceito social e o racismo dentro do futebol brasileiro: a assinatura da “Resposta Histórica”, feita pelo Club de Regatas Vasco da Gama. O acontecimento ficou na história como um dos momentos mais simbólicos e identitários do clube.

Há 100 anos, o esporte era direcionado para a alta sociedade e havia uma grande exclusividade aos homens brancos, diferentemente dos jogadores que o Vasco possuía no elenco. No time, havia negros, operários e pessoas de origem humilde. Esse foi o coletivo que levou o Vasco da Gama à primeira divisão do campeonato estadual. Em sua primeira participação na elite, o clube foi campeão com uma campanha de 11 vitórias, 2 empates e apenas 1 derrota. 

O título conquistado pelo elenco motivou a Liga Metropolitana a ser desfeita pelos clubes participantes. Diante disso, houve a criação da Associação Metropolitana de Esportes Atléticos (AMEA) e seu campeonato com regulamento diferente. América, Bangu, Botafogo, Flamengo e Fluminense estabeleceram que, para se inscrever na competição, o jogador precisava possuir uma profissão definida e deter conhecimento da leitura e escrita. 

O Vasco, após ser convidado a se filiar, inscreveu seus atletas e recebeu a condição de exclusão de 12 deles, todos os negros e operários. A associação justificava a sua posição de rejeição, uma vez que havia dúvida sobre as profissões dos jogadores. O presidente do clube cruzmaltino, José Augusto Prestes, que já havia tentado uma resolução sem segregação, redigiu uma carta informando que o time não iria abrir mão de seu elenco e desistiria de ingressar na AMEA, o que ficou conhecido como a “Resposta Histórica”.

A ação auxiliou na profissionalização do futebol, entre os anos de 1930 e 1940, que integrou muitos atletas pretos e facilitou o surgimento de ídolos do esporte, como Pelé, Jairzinho e Garrincha. A produtora de conteúdo sobre futebol e torcedora Giulia Dias defende que a Resposta é de grande orgulho para o vascaíno, além de ser reconhecida por outras torcidas em todo o Brasil. “Em quase todos torcedores que já conheci, de diversos times e estados diferentes, vi uma grande admiração por essa parte da história e o reconhecimento da importância de hoje o futebol abraçar todos, sem distinção”, afirma Giulia. 

O documento também contribuiu para que se criasse uma identificação da população e uma marca para o clube, que posteriormente seria conhecido como “O Clube do Povo”. Wallace Neguere, apresentador do SBT Sports Brasília, ressalta o legado da Resposta Histórica: “É a identificação que o Wallace Neguere e outros negros tem com essa luta que o Vasco travou lá atrás, há 100 anos, que hoje nos representa. Essa carta é nossa identidade.”

Em uma pesquisa publicada pelo Observatório da Discriminação Racial no Futebol em 2023, 508 atletas das séries A e B feminina e masculina foram entrevistados e 41% se declarou negra. Todos revelaram já terem sido vítimas do preconceito racial, o que denuncia uma intolerância ainda persistente na sociedade e que se manifesta no meio esportivo. O jornalista Lucas Pedrosa reflete sobre o impacto do documento: “Fincar essa bandeira há 100 anos foi algo histórico. O racismo continua, infelizmente, mas, sem dúvida alguma, o poder de conscientização de um clube do tamanho do Vasco interfere na sociedade brasileira como um todo.” 

Mesmo após um século do início da luta, a discriminação persiste e se faz presente no esporte. Como exemplo, há os casos de preconceito sofrido por Vinicius Jr., jogador do Real Madrid, desde o início de sua carreira no Clube de Regatas do Flamengo. O atleta tem sofrido ataques racistas da imprensa espanhola e de torcidas adversárias, seja dentro ou fora de estádios. Os insultos direcionados a Vini Jr colocam em evidência a ausência de punição para quem pratica atos de injúria, uma vez que o desrespeito se repete continuamente. 

O atacante desabafou sobre os casos de racismo que sofreu em uma coletiva de imprensa realizada no dia 25 de março, às vésperas do jogo da Seleção Brasileira contra a Espanha. Emocionado, o jogador relatou sobre a negligência dos repórteres espanhóis em ver que a cada dia que passa, ele se encontra mais triste e com menos desejo de jogar futebol. O influenciador vascaíno João Almirante reflete sobre a situação: “Isso mostra para a gente que é preciso estar o tempo inteiro vigilante e o tempo inteiro ainda lutando contra o racismo, a luta que lá atrás é uma luta que infelizmente ainda é necessária no dia de hoje”.

A Resposta Histórica segue como um dos episódios mais importantes do futebol brasileiro. Mesmo 100 anos depois, jornalistas e torcedores relembram o ato que extrapolou as quatro linhas e trouxe a inclusão social e racial no esporte. Os impactos do documento seguem até os dias atuais, com atletas que ainda lutam contra o racismo no futebol nacional e mundial.

 

Reportagem: Fátima Morais, Júlia Mota e Taís Vianna

Supervisão: Davi Rosenail e Eduardo Gama