Ataques no Rio Grande do Norte chegam ao nono dia e afetam o cotidiano da população
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A onda de ataques ocorridos nas cidades do Rio Grande do Norte chegou ao seu nono dia nesta quarta (22). Segundo a Secretaria de Segurança Pública do RN, até o momento foram mais de 300 atos criminosos ao longo desses nove dias. Em sete anos, essa é a quarta vez que grupos criminosos tomam conta das cidades. Todos os confrontos possuem relação com facções que atuam no local. Em 2013, a morte de Berg Neguinho por presos ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) foi o estopim para a criação de um grupo rival chamado Sindicato do Crime (SDC).
Atualmente, é especulado que essas facções deram uma trégua para protestar contra o sistema carcerário. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (Sesed) nega que essa seja a motivação e afirma que os ataques são uma retaliação a ações policiais de combate ao tráfico e ao crime organizado. Enquanto isso, o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) garante ter encontrado evidências de tortura, falta de alimentos e superlotação nas cadeias.
Desde o dia 14 de março, o estado vive em um completo caos. O pânico começou depois de prédios públicos e privados serem depredados e veículos incendiados em, pelo menos, 20 cidades potiguares. Mesmo com a segurança reforçada e mais de cem pessoas presas, os ataques continuam. Até o momento, um comerciante, um policial penal e dez suspeitos dos atos foram assassinados, incluindo Francisco Allison de Freitas, conhecido pelo codinome “Nazista”, suspeito de ser líder de uma das facções envolvida no confronto. O governo estadual não divulgou o número total de mortos.
Segundo Cefas Carvalho, jornalista e escritor, o problema é fruto das fracas administrações dos mandatos anteriores, que não investiram na segurança e pouco se preocupavam com a questão carcerária.
“A segurança pública vem sendo negligenciada e sem receber investimentos há várias gestões. A governadora Rosalba Ciarlini (2011-2014) administrou muito mal a questão de segurança, sem investimentos e ignorando as questões carcerárias e a bomba estourou no governo seguinte, de Robinson Faria (2015-2018). Os governantes entraram em desespero, admitiram a incapacidade de gerir a situação e repassaram o comando para o governo federal e para as forças armadas”.
Na última segunda-feira (20), o ministro da justiça, Flávio Dino, anunciou o envio de R$100 milhões para a segurança do estado. O objetivo é empregar esse dinheiro para investimentos na Segurança Pública, além do aumento de vagas em unidades prisionais, criação de outro presídio e investir em medidas de ressocialização dos presos. Fátima Bezerra, atual governadora, também anunciou uma parceria com o Ministério da Educação para a compra de novos transportes escolares que foram danificados.
As universidades que suspenderam as aulas, como UERN e UFRN, marcaram para a próxima segunda-feira (27) o retorno das atividades. O transporte público na capital Natal e na cidade de Mossoró foram suspensos, assim como o transporte intermunicipal. Além disso, eventos como partidas de futebol e festivais gastronômicos como Food & Jazz Natal e Sabores D’Praia foram suspensos. “Infelizmente as aulas da minha universidade estão suspensas, e pensando principalmente nos alunos das cidades vizinhas que necessitam de transporte público para se deslocar, que no caso estão suspensos também. É uma situação triste ter a nossa educação à mercê de organizações criminosas.” diz Maíra Trindade, estudante de direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.
Cefas conta que as redes sociais possuem influência no receio da população em sair de casa. O jornalista afirma que muitas notícias falsas foram divulgadas em grupos do Whatsapp, que colaboraram para causar aflição aos moradores. “Venho escrevendo e denunciando isso desde a primeira noite de ataques, inclusive foi tema de meu texto ‘Crime organizado toca o terror; os grupos de zap também!’ Logo no dia seguinte centenas de grupos de zap não apenas registravam os ataques, mas os amplificaram e distribuíram muitas fake news, criando um clima de pânico na população que levou comerciantes a fechar lojas e estabelecimentos de comida e bebida mesmo em bairros onde até hoje nenhuma ocorrência foi registrada.”, comenta.
Maíra complementa dizendo que, por mais que haja policiais patrulhando, há um receio em grande parte da população, que prefere permanecer seguros em casa do que se arriscarem nas ruas. “É uma situação triste ter a nossa educação à mercê de organizações criminosas. Existe o medo constante de sair de casa e se deparar com algum ato de violência, as ruas estão lotadas de policiais, o que deveria nos dar segurança, mas só nos gera mais receio de acabar sendo alvo de algum ataque”, finaliza a estudante.
Hoje, quarta-feira (22), 26 mandados de busca e apreensão foram cumpridos e 15 suspeitos presos por participar das facções criminosas acusadas pelos ataques Rio Grande do Norte. Já a embaixada dos Estados Unidos recomendou revisar os planos de viagem para o estado.
Reportagem: Bernardo Erthal, David Silva e Lorenna Medeiros
Supervisão: Heitor Leite e Maria Eduarda Martinez
Imagem de capa: Reprodução/Redes Sociais